Lembram-se do Tazz? Aquele carro fantástico que alugámos a um sucateiro de Joanesburgo?
Pois, em cerca de 1 mês e meio (entre Março e Abril), ao abrir a janela do condutor, o vidro caiu para dentro da porta 3 vezes. 3 !!! E sempre ao final do dia quando saía do escritório.
A história foi quase sempre a mesma:
- Ao sair do escritório, abria a janela para passar o cartão para levantar a cancela e..... clunk! caía o vidro para dentro da porta.
- Regressava a casa de janela aberta, com um frio desgraçado.
- Telefonava ao mecânico do sucateiro.
- Ia para o trabalho de janela aberta, novamente a apanhar frio.
- O mecânico chegava, arranjava a janela e dizia: "espere umas horas e só depois é que abra o vidro".
- Uma semana e meia depois, o vidro repetia o mesmo procedimento.
Houve uma vez em que o mecânico só veio arranjar a janela após 2 dias. Assim, foram 2 dias a apanhar frio de manhã e à noite.
Após a terceira vez, deixei de abrir a janela. Sempre que tinha que passar o cartão para abrir uma cancela, abria a porta e passava o cartão. E são 3 vezes em cada viagem.
Aliado a isto e ao facto de ficarmos pelo menos mais um ano na África do Sul (até Agosto de 2014), decidimos comprar um carro. Ora, para ter um carro é necessário um documento chamado "Traffic Register".
E o que é necessário para ter o Traffic Register? Um monte de documentos e respectivas fotocópias, mais um comprovativo de residência e no caso de ser estrangeiro, um comprovativo de trabalho. E dizem eles:
"Não há problema que a empresa dá-te o comprovativo de trabalho e também o de residência." OK, parece ser facil, pensei ingenuamente.
Dirigi-me ao local (obviamente, com a ajuda do GPS), entro no edifício onde diz "Traffic Registration" e pergunto à recepcionista que estava mais interessada no café:
- Eu: Onde posso pedir o Traffic Register?
- Recepcionista: O quê?
- Eu: Onde posso pedir o Traffic Register?
- Recepcionista: O quê?
- Eu: Onde posso pedir o Traffic Register?
- Recepcionista: No edíficio ao lado.
- Eu: WTF? Porque raio está lá fora um sinal a dizer "Traffic Registration" neste edifício?
- Recepcionista: O quê?
- Eu: Obrigado.
Entro no segundo edifício, pergunto ao segurança:
- Eu: Onde posso pedir o Traffic Register?
- Segurança: No balcão 12, mas só pode pedir entre as 7:00 e as 10:00 (azar, eram 10:20).
Fiz-me de parvo (o que não é muito dificil, dirá o Bigorrilhas) e fiquei na fila. Parêntesis: o local lembrou-me a repartição de Finanças de Loures quando ia entregar o Imposto Complementar dos Silvas sénior na década de 80 (filas enormes, edificio velho, muita gente assustadora).
Quando chegou a minha vez:
- Eu: Venho pedir o Traffic Register.
- Funcionária (olha para o relógio, troca umas palavras num dialecto local com as colegas e diz): Tem o formulário preenchido?
- Eu: Não.
- Funcionária (troca mais umas palavras no dialecto local, entrega-me o formulário e diz): Preencha e vá outra vez para a fila.
Quando chegou novamente a minha vez, com o formulário preenchido:
- Funcionária: Dê-me os documentos.
- Parêntesis (Somos interrompidos por um cidadão local):
- Cidadão local: Onde posso pedir o Traffic Register?
- Funcionária: Aqui, mas só entre as 7:00 e as 10:00 (neste momento, já são 11:00).
- O cidadão local olha para os meus documentos e diz: mas este senhor está aqui a tratar disso.
- Funcionária: este senhor chegou às 8:00 (lol).
- Cidadão local: mas eu preciso do documento hoje para registar o meu carro.
- Funcionária: vá para a fila.
- Funcionária (dirigindo-se a mim): Dê-me os documentos.
- Funcionária (olha para os documentos): Onde está o seu comprovativo de residência?
- Eu: Está aqui nesta folha.
- Funcionária: Este é o seu comprovativo de emprego.
- Eu: Certo, mas também tem no parágrafo abaixo a minha morada.
- Funcionária: Este é o seu comprovativo de emprego.
- Eu: Sim, mas eu estou a dizer que na mesma folha estão as duas coisas.
- Funcionária: Mas você vive no trabalho?
- Eu: Não. A empresa comprova que estou empregado e na mesma folha comprova a minha residência.
- Funcionária: Mas você vive no trabalho?
- Eu: Não.
- Funcionária: Então, se não vive no trabalho, a empresa não pode comprovar a sua morada. Tem que trazer outro comprovativo.
- Eu: Por exemplo?
- Funcionária: O contrato de arrendamento, uma factura.
- Eu: Mas a empresa comprova que eu vivo nessa morada.
- Funcionária: Mas você vive no trabalho?
- Eu (percebendo que já nada havia a fazer): Não.
Saí dali com a mesma raiva que sentia quando a senhora das Finanças encontrava mais um erro na declaração do Imposto Complementar dos Silvas sénior, porque sabia que tinha que lá voltar e gramar mais do mesmo.
Dois dias depois, voltei ao local, munido de todos os comprovativos de residência que podia imaginar:
- Factura de Internet.
- Contrato de Internet.
- Contrato de arrendamento da casa.
Chego ao local (dentro do horário oficial), encontro uma fila enorme, que incluia mulheres grávidas e outras com filhos ao colo (aqui, os serviços públicos ainda não sabem o conceito de atendimento prioritário) e após 20 minutos, chega a minha vez:
- Eu: Venho pedir o Traffic Register.
- Funcionário (era outro): Tem o formulário preenchido?
- Eu: Sim, estive cá anteontem.
- Funcionário: Ah, então já tens tudo o que é preciso. Dá cá.
- Eu entrego-lhe os documentos.
- Funcionário (sem olhar para nenhum documento): Vem cá daqui a 4 dias buscar o Traffic Register.
- Eu: ........
- Funcionário: Mais alguma coisa?
- Eu: Sim. Para vir buscar o Traffic Register é neste balcão?
- Funcionário: Sim.
- Eu: OK, obrigado.
Quatro dias depois volto ao local (dentro do horário oficial) e coloco-me na fila novamente. Desta vez, a fila é maior do que o costume, com mais grávidas e crianças de colo. Após 30 minutos, é a minha vez:
- Eu: Venho buscar o Traffic Register.
- Funcionário: Não é aqui. É no balcão 1.
- Eu: .........
Dirijo-me ao balcão 1, entrego o passaporte (não havia fila) e recebo o documento. Ei-lo finalmente:
Sim, se repararem no nome (caso consigam parar de rir com a foto) diz "Louranco" e não "Lourenço", mas depois de tantas aventuras, decidi que ficaria assim mesmo.
Em paralelo, estava a decorrer o processo de aquisição do carro, que foi muito mais pacífico do que o processo do documento e não tem grande história. Foi comprado num stand cujos donos, curiosa e casualmente, são portugueses:
O único facto digno de nota (pelo seu rídiculo) é que após o processo de entrega (que dura mais de uma hora onde se valida que tudo funciona), o cliente tem que tocar um sino que existe no stand para "dar sorte".
Após três semanas a andar com o carro, aconteceu algo que nunca tinha acontecido com o Tazz: multa por excesso de velocidade. 71 kilómetros por hora quando o limite eram 60.
Ainda pensei que o polícia me iria pedir dinheiro para não passar a multa (segundo contam, é muito usual), mas começou logo a escrever a multa, que tem um valor astronómico: aproximadamente 20 euros. Mas como este país é um espectáculo, se pagar nos primeiros 32 dias, aplicam um desconto de 50%.
Fica o registo:
Saudações sul africanas.